"Cinema Delas": produtora de audiovisual fala sobre experiência nos EUA
As pessoas atuantes no cenário regional de produção audiovisual independente feminina foram a essência do Encontro Internacional de Pesquisa em Artes Visuais “Cinema Delas”, ocorrido em maio de 2018 na Universidade Federal do Sul da Bahia em Itabuna. O evento foi realizado pela Assessoria de Relações Internacionais e pela Pró-Reitoria de Sustentabilidade e Integração Social (Prosis), com apoio da Red Latinoamericana de Investigaciones en Practicas e Medios de la Imagen, Lêtera, Núproart e Centro de Cultura Adonias Filho. O evento integrou a programação institucional em homenagem aos 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Um dos curtas exibidos na ocasião, “O babado da Toinha” dirigido por Aranda Souza, Julia Aguiar, André de Oliveira e Antonio Ternura, teve uma oportunidade de exposição nos Estados Unidos após a participação no evento. Aranda Souza levou o curta e a experiência para expor fora do país a convite da produtora audiovisual e professora Bernadette Wegenstein (John Hopkins University), e fala sobre essa vivência oportunizada no Cinema Delas:
ACS – Como foi levar o "Babado da Toinha" para os EUA? Como você percebeu a receptividade?
Aranda Souza – Era uma exibição para tratar do tema de gênero, coisa do grupo de pesquisa de Bernadette. E em relação à receptividade, eles estavam ali querendo essa troca, beber da fonte, sentir essa energia do Brasil e entender o que era o dendê. Porque acho que, na verdade, na exibição tinham uns dois brasileiros, então teve perguntas sobre o óleo, sobre essa palmeira e tal, como que funciona. Então eu falei um pouco da comida típica, de como é para a gente o dendê, do sagrado, da dificuldade de encontrar o coco, do preparo. Trouxe para eles esse desafio, as dificuldades tanto de fazer o audiovisual aqui quanto as dificuldades do território. Eu estava representando o meu território. Eles foram muito solidários em relação ao nosso momento político no Brasil, eu me senti muito acolhida. E inclusive na própria exibição houve perguntas sobre isso, todo mundo muito preocupado. Eu senti que a galera lá de Baltimore... a cidade de Baltimore é muito universitária, tem cinco universidades lá, cidade tipicamente de origem inglesa, com uma cena cultural incrível, cerca de 300 mil habitantes. Essa galera que eu vi circular lá me pareceu uma galera muito politizada, consciente.
ACS – O que marca o diferencial das produções audiovisuais locais?
Aranda - Eu acho que esse pessoal da produção independente, tem muita gente boa nascendo aí. A gente, de alguma forma, por alguma lacuna, uma ferida, algo mais profundo da nossa ancestralidade, a gente tende a produzir coisas que tenham essa identidade, algo que diga “meu Deus, onde a gente está, para onde a gente vai?”. E eu acho que é até meio inconsciente isso. Lembro do último Feciba, tirando as mostras de gênero, mais específicas, e de temas políticos, o retrato tem muito de nossa identidade, de coisa honrar. A Bahia tem um jeito, né? A gente se ama muito, a gente ama muito ser baiano, estar aqui, e tem muita crise de identidade nesse sentido. Então eu sinto que tem muita alegria, tem um charme, tem esse movimento, que é muito a Bahia. E fica a coisa de identidade, pode ver, pode ser um filme bem simples, você vê um pé rachado ali no sertão, uma cantiga, uma fala, um tom, e muito da identidade mas de algo que a gente fica tentando tocar de novo, tentando entender.
ACS – Que temas lhe provocam mais, e por que eles te atraem mais?
Aranda – Eu gosto muito de biografia, de contar histórias. Sou uma contadora de histórias e gosto de ouvir histórias. Gosto de contar história de vida, de amor, da pessoa. As Narrativas, por exemplo, foram várias escolhas. A gente sabe, a gente conhece as pessoas, as histórias. Eu sou muito do documentário, de biografia, de conhecer a história das pessoas, de honrar a sua história. Tem histórias tão inspiradoras por aí, gosto de trazer vida para essas histórias.
ACS – No curta, Toinha diz gostar do fabrico do azeite de dendê, que é uma atividade bem mais árdua que o preparo do acarajé, diz se identificar mais com essa fase do trabalho. Na sua atividade profissional, de qual fase do trabalho você gosta mais, ou com qual delas você se identifica mais?
Aranda – Eu gosto muito de produzir, dessa coisa do campo, de articular com as pessoas, que tem a ver com as minhas habilidades, essa articulação. Eu sou orgânica, intelectual orgânica, eu gosto do contato com as pessoas e de respeitar o que está ali no jogo. Agora, eu sou apaixonada por roteiro, posso te dizer que roteiro é algo que me encanta, por isso que sempre meto o bedelho. E tem hora que estou no roteiro, tem hora que estou na direção. Como a gente trabalha bem, a gente vai metendo o bedelho no trabalho um do outro. Não tem cricri, a gente fala. E a gente está produzindo, dirigindo, entrevistando. É mais esses processos cooperativos. A gente em Serra trabalha muito com esse novo mundo que a gente quer ver.
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