Estudo descreve papel do Reservatório do Funil (RJ) no fluxo biogeoquímico no rio Paraíba do Sul
Uma pesquisa apontou os processos responsáveis pela composição química encontrada no rio Paraíba do Sul, na divisa entre os estados do Rio de Janeiro e São Paulo, nas imediações do Reservatório do Funil. Dentre os achados, a constatação de que o reservatório é como uma barreira biogeoquímica que afeta os fluxos de elementos químicos no rio, em especial os chamados elementos de terras raras, como são conhecidos os elementos da série dos lantanídeos na Tabela Periódica. O artigo Geochemical behavior of rare earth elements (REE) in urban reservoirs: the case of Funil Reservoir, Rio de Janeiro State, Brazil, publicado na revista Enviromental Monitoring and Assessment, é assinado por Joanna Maria da Cunha de Oliveira Santos Neves (UFSB), S. R. Patchineelam (UFF), D. F. Araujo (IFREMER - França), J. M. O. Godoy (PUC-RJ) e A. C. Almeida (PUC-RJ).
A professora Joanna, que leciona e pesquisa no Centro de Formação em Desenvolvimento Territorial (CFDT/UFSB), explica que o objetivo do trabalho foi avaliar os processos geoquímicos que são responsáveis pela composição química encontrada no trecho fluvial, e explicar como a geoquímica é influenciada pelas interferências no curso do rio Paraíba do Sul, especificamente a presença do Reservatório do Funil. Ela conta que o reservatório está localizado na divisa dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo e foi construído em 1969 com o intuito de abastecer a cidade de Resende (RJ) e de produzir energia elétrica. Outra função da estrutura é ajudar a regularizar a vazão do rio Paraíba do Sul, atenuando os impactos das cheias e permitindo a transposição do volume de água para o conjunto de reservatórios do sistema LIGHT, que é a principal fonte de abastecimento de água para a região metropolitana do Rio de Janeiro.
Para isso, a equipe de cientistas coletou amostras da água no reservatório e em mais dois trechos do rio Paraíba do Sul, um a montante do reservatório, em Queluz (SP), e outro a jusante, em Itatiaia (RJ) e realizou análises físico-químicas. Nas amostras, a atenção foi voltada para a presença de elementos químicos da série dos lantanídeos, ou elementos de terras raras (REE, na sigla em inglês). "São elementos químicos especiais porque apresentam propriedades químicas únicas, que são resultantes da configuração eletrônica desses elementos. A literatura refere-se aos REE como excelentes marcadores geoquímicos, pois esses elementos fornecem informações sobre a origem do material e sobre possíveis intervenções antrópicas na área de estudo", detalha a professora Joanna. Todo uso e ocupação de solo nas imediações dos rios é uma intervenção feita pelo ser humano no ambiente, e essas mudanças podem ser percebidas também pela composição fluvial e pela partição dos elementos químicos entre as diferentes fases dissolvida e particulada dos rios estudados na pesquisa
Estudar as concentrações e as presenças de elementos terras raras nos ambientes permite saber as concentrações, avaliar o fluxo de transporte fluvial e fazer inferências a respeito do tipo de intervenção humana na região estudada, explica a cientista. Os elementos terras raras apresentam propriedades químicas únicas, e essas peculiaridades fazem deles marcadores úteis para entender os processos que movimentam elementos químicos pelo rio durante o intemperismo, inclusive a redistribuição deles na passagem da fase particulada para a fase dissolvida nos ambientes aquáticos.
Com esses marcadores, conforme o estudo, é possível conduzir pesquisas sobre como elementos químicos estão se comportando ao longo de um rio - uma das justificativas para o estudo foi exatamente o histórico de contaminação das imediações do rio Paraíba do Sul, que em seu curso recebe influxos de resíduos residenciais e industriais, fontes de contaminação em potencial das águas destinadas ao abastecimento da população e à geração de energia hidrelétrica para a região metropolitana do Rio de Janeiro.
Os resultados das análises apontaram para a concentração dos REE no reservatório, com a presença mais significativa dos elementos lantânio, cério e európio. Dentre as inferências feitas pela equipe de cientistas no artigo, a presença anômala de lantânio na amostra coletada em Queluz, mais alta ali em comparação com o percebido nos outros pontos estudados, sugere contaminação antrópica, provavelmente por conta da alta densidade populacional e da atividade industrial próxima. As algas presentes no reservatório tendem a absorver e liberar os REE e apresentam períodos de intensa proliferação, o que é mais um fator de interferência no fluxo dos elementos químicos. "Os dados indicam que o Reservatório do Funil exerce o papel de uma barreira biogeoquímica, modificando o transporte fluvial dos REE associados à fração particulada e dissolvida das águas do trecho do Médio Paraíba do Sul. As algas também exercem influência sobre o comportamento geoquímico dos REE, absorvendo-os e liberando-os para o meio aquático, exatamente como ocorre com muitos metais", afirma a professora Joanna.
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