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PROEX entrevista Prof. Eymard Vasconcelos

Publicado: Segunda, 12 de Julho de 2021, 14h29 | Última atualização em Sexta, 02 de Junho de 2023, 17h12 | Acessos: 1349

“Projetos teóricos e metodológicos têm muito menor chance de gerar transformação do que a força irradiadora de aprendizados fascinantes vividos.” 12 Jul. 21 - Luana Campinho Rêgo Coordendora de Educação Popular e TS- Proex

A Proex lançou no dia 07 de julho, o edital 02/2021 de bolsas a discentes da graduação vinculados/as à Projetos de Extensão Popular. Para incentivar e fomentar práticas extensionistas na dimensão popular, a Proex divulga uma série de entrevistas, aulas entre outros materiais com pesquisadores e autores que são referências na temática e lança a Campanha ‘Entendendo a Extensão’ a qual tratará sobre temáticas essenciais à extensão universitária. Nesta entrevista, o Dr. Eymard M. Vasconcelos, Professor da UFPB, médico, autor de diversos livros e artigos e com uma trajetória de 46 anos de atuação em práticas e estudos no campo da saúde comunitária, nos fala de forma sensível e madura sobre sua experiência e opiniões referentes às práticas extensionistas e à inserção da extensão no currículo da graduação.

O que pode ser considerado e que características são esperadas de um projeto de extensão popular?

Extensão Popular é a extensão universitária orientada pela Educação Popular, proposta pedagógica sistematizada inicialmente por Paulo Freire. Mas não é apenas uma ação educativa que se orienta pela metodologia e teoria da Educação Popular na sua relação com os educandos populares, em suas práticas sociais. É preciso que essa metodologia seja aplicada também na relação entre os professores e os estudantes. Assim, não pode ser uma extensão em que o docente, especialista em Educação Popular, defina estratégias da ação para que os estudantes do projeto sigam. Cada passo do projeto precisa ser definido em conjunto, a partir da criação de espaços de problematização e negociação geridos de forma bem democrática. É fundamental cultivar o protagonismo dos estudantes em conjunto com o protagonismo dos grupos populares envolvidos.

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Prof. Dr. Eymard Mourão Vasconcelos, autor de diversos livros e artigos sobre educação em saúde, saúde comunitária, extensão universitária, espiritualidade no trabalho em saúde e formação universitária em saúde.

Qual importância ou possíveis contribuições à formação discente de um projeto de extensão popular? Ainda quais posturas ou modo de conduzir do(a) coordenar(a) do projeto poderiam facilitar nessa formação?

O ensino universitário em saúde está orientado principalmente pela perspectiva de ensino de conteúdos e habilidades, consolidadas profissionalmente, para estudantes que precisam se esforçar para os incorporarem. Bom estudante seria aquele que incorpora bem os conteúdos presentes nos manuais e explanações dos professores, tornando-se bons operadores desses saberes e práticas já definidos previamente no currículo do curso. A pedagogia universitária freireana (que pode estar tanto na extensão como nas disciplinas e na pesquisa) rompe com esse modelo. O estudante é inserido na realidade social e nos espaços de prática profissional para conviver com as suas situações, dilemas, dores e iniciativas prévias de enfrentamento. Cuida-se principalmente para que os estudantes se aproximem dessa realidade de forma compreensiva e respeitadora da cultura, interesses e saberes do público. Desse encontro surgem questões e desafios que são discutidos no grupo para a busca de soluções. Estudos e pesquisas são planejados. Surge também um progressivo vínculo e compromisso com as pessoas em cuidado. As soluções construídas de forma compartilhada vão sendo implementadas, procurando valorizar suas insuficiências e erros. Assim vai se desenvolvendo um processo continuado de parceria na busca das soluções e de uma melhor compreensão dos problemas. Isso só acontece se o projeto tiver um vínculo duradouro com a comunidade.

“Cada passo do projeto precisa ser definido em conjunto, a partir da criação de espaços de problematização e negociação geridos de forma bem democrática. É fundamental cultivar o protagonismo dos estudantes em conjunto com o protagonismo dos grupos populares envolvidos com a comunidade.”

Quais conselhos o Sr. daria para a elaboração de uma proposta de extensão popular?

Em cada lugar e em cada contexto de ensino há peculiaridades muito próprias, impossíveis de serem previstas e planejadas previamente. O lugar de inserção, as prioridades e a maneira de começar vão depender dos valores das pessoas envolvidas, das circunstâncias institucionais e dos grupos sociais, bem como das oportunidades que surgem no momento. Assim cada projeto é novo. É uma criação circunstancial. Mas tem um eixo orientador claro e forte: a busca de responder às necessidades concretas dos estudantes, um compromisso com o enfrentamento do sofrimento das pessoas e comunidades, uma construção coletiva junto com os que se dispõem a contribuir e uma vontade firme de compreender profundamente os desafios, os determinantes e as possibilidades dessa realidade, articulando saberes acadêmicos, populares e os provenientes da vivência local. E também um propósito claro de fortalecer o protagonismo e a democracia entre os educandos, visando o fortalecimento da justiça e solidariedade na sociedade. Conhecer outros projetos de extensão popular é importante para inspirar caminhos de compreensão e ação, mas cada realidade exige um projeto próprio. Depois que se aprende a caminhar na imprevisibilidade do agir a partir do diálogo com as peculiaridades de cada situação, a insegurança inicial vai se transformando em confiança principalmente quando se começa a surpreender com a criatividade dos resultados que vão sendo conquistados por esse jeito de trabalhar.

“Depois que se aprende a caminhar na imprevisibilidade do agir a partir do diálogo com as peculiaridades de cada situação, a insegurança inicial vai se transformando em confiança...”

A UFSB está em fase de discussão sobre a inserção da extensão nos cursos de graduação, o Sr. poderia nos falar sobre sua experiência na UFPB e que fatores considera importantes a serem observados?

A extensão, por ter uma regulamentação institucional menos rigorosa, permite a experimentação de formas de atuação educativa que vão gerando aprendizados, permitindo depois a elaboração de propostas mais elaboradas e enquadradas nas normas exigidas pelo projeto político e pedagógico de cada currículo de graduação. Costumo dizer que a extensão é o movimento social dentro da universidade. O instituinte que constrói caminho para uma maior institucionalização, seja pela incorporação da extensão no currículo, seja por inspirar caminhos de organização pedagógica das disciplinas obrigatórias. Essa foi a experiência da UFPB. Projetos de extensão popular foram gerando formatos de organização do aprendizado. Professores foram se formando e se encantando com esse jeito de atuar e passaram a divulgar entre seus colegas. Estudantes foram conhecendo caminhos do ensino fora dos modelos tradicionais e começaram a divulgar para professores e estudantes. Trabalhos feitos a partir dos projetos de extensão foram encantando nos congressos nacionais, gerando respeito até por colegas que antes faziam oposição. Não basta ter boas propostas, é preciso que elas consigam apoio e encantem a comunidade acadêmica para que deixem de ser iniciativas isoladas. É preciso conquistar essa legitimidade política para que a instituição aceite incorporar de forma mais ampla à sua estrutura. Isso leva algum tempo. Há portanto uma ação pedagógica que acontece dentro dos projetos e uma outra que transborda para a instituição. A comunidade acadêmica não aceita mudanças amplas quando não vislumbra claramente bons resultados, principalmente quando se está propondo algo fora do modelo tradicional. A pressa na institucionalização da educação popular pode gerar conflitos e antagonismos que acabam paralisando o processo. Embates teóricos sobre projetos teóricos e metodológicos têm muito menor chance de gerar transformação do que a força irradiadora de aprendizados fascinantes vividos e da criatividade inovadora das práticas de cuidado, que vão sendo geradas nessas experiências de extensão orientadas pela Educação Popular. Paulo Freire tornou-se ultimamente foco de grande polêmica política que tem fechado ouvidos e corações. O contato com a empolgação e o sucesso social dessas práticas, no cotidiano da universidade, convence o coração. A força do real supera o fechamento trazido pela polarização ideológica.

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